Estudo mostra que Estado fica mais quente a cada década, criando ambiente de proliferação para o mosquito
Pernambuco está ficando mais quente a cada década e continuará a esquentar nos próximos quarenta anos. A descoberta e a previsão foram realizadas a partir de estudos estatísticos complexos utilizando os registros de temperatura em Pernambuco desde os anos 1950 até 2011. Pesquisadores do Instituto Agronômico de Pernambuco (Ipa), responsáveis pela análise, também descobriram que a quantidade de chuvas no Estado está diminuindo. As mudanças registradas vão na esteira do aquecimento global e tornam o clima do estado ainda mais propício à proliferação do Aedes aegypti.
O estudo, publicado pela primeira vez na revista científica norte-americana Earth Science & Climatic Change no final do ano passado, mostra a mudança em cinco pontos de Pernambuco: Recife, na Região Metropolitana; Vitória de Santo Antão, na Zona da Mata; Caruaru, no Agreste; Petrolina e Arararipina, ambas no Sertão. São as únicas cidades pernambucanas que têm registros ininterruptos do clima de pelos menos 40 anos. “Todas as cidades apresentaram aumento da temperatura máxima. A que mais esquentou, Araripina, viu o termômetro subir 1,2 graus por década entre 1962 e 2011. Esse é um recorde na América Latina. Para se ter uma ideia, o segundo lugar é Vitória, que aumentou quase meio grau por década”, explicou uma das autoras do artigo, a meteorologista do Ipa Francis Lacerda, que estudou o assunto em sua tese de doutorado.
Com os números, os meteorologistas podem estimar o clima pernambucano até 2050. E o calor vai continuar a aumentar. As chuvas se tornarão mais escassas. “Começamos a perceber uma diminuição no nível pluviométrico e podemos notar uma alteração nos ciclos hidrológicos. As chuvas mudam de comportamento. Então, chove menos e mais espaçadamente na época de chuvas, o que pode causar sérios problemas. Um deles é a segurança alimentar. Culturas como o milho e o feijão provavelmente não se adaptarão e os agricultores irão tentar mantê-las vivas utilizando a água incorretamente ou aplicando mais agrotóxicos”, previu Francis.
Para o meteorologista Geraldo Majella, o problema deve ser agravado principalmente por causa da ainda crescente urbanização e do desmatamento. “Nós já somos deficitários em recursos hídricos por natureza, mas estamos cobrindo artificialmente o solo e a população está aumentando. Isso piora o problema inicial. E com o aumento do calor, a chuva evapora mais, também. Então, é preciso saber que tipo de intervenções fazer. A transposição funciona apenas quando há água. Quando não há, intensifica a seca. Passamos por um processo de aridificação”. Recife é a cidade pesquisada que mais deixa de chover. A cada década, a média de chuva anual diminui em 44 milímetros. Petrolina vem em segundo lugar registrrando diminuição de 42 milímetros por década.
Tanto a falta de recursos hídricos quanto o aumento da temperatura podem trazer consequências negativas para o pernambucano, além das que os pesquisadores do Ipa já citam. De acordo com a coordenadora do Programa de Controle de Dengue, Chikungunya e Zika, Claudenice Pontes. “Há três anos, quase não víamos casos da doença em cidades como Triunfo, com climas mais amenos e alta altidude, porque essas são características desfavoráveis para o mosquito. Hoje, todo o Estado está em situação de risco, sem exceção. Minha suspeita é que um aumento de temperatura está relacionado a isso”, palpitou.
Quanto aos níveis pluviométricos, a coordenadora explicou que é comum achar que o mosquito vai ter menos lugares para se reproduzir caso chova menos. Mas essa lógica não se aplica à realidade. “Quanto mais a população prevê risco de falta d’água, mais estoca água de maneira incorreta. Cidades como Afogados da Ingazeira, no Sertão, mesmo quentes e secas, não estão livres da doença”, esclareceu. No ano passado, o prefeito do Recife Geraldo Julio afirmou que 75% dos focos de Aedes na cida
de estão dentro das residências.
Folha de Pernambuco
Foto: Leo Motta