Por Rafael Torres*
A matéria já fora objeto de repercussão geral no Supremo Tribunal Federal, segundo esta corte, em regra, não é possível que os editais de concursos estabeleçam restrições a pessoas com tatuagens. Todavia, excepcionalmente, é possível que o edital imponha restrição a candidatos que possuam tatuagens cujo conteúdo viole valores constitucionais.
A tatuagem, no passado, especialmente durante o século XIX, era uma prática associada a determinados grupos sociais que viviam à margem da sociedade, sendo conhecida como “flor do presídio”.
Desse modo, durante muitos anos, no imaginário social, a tatuagem foi vista como marca da marginalidade e da delinquência. Segundo os sociólogos, no entanto, o sentido estigmatizador do uso da tatuagem começou a mudar a partir da década de 80.
O certo é que, atualmente, a tatuagem, por si só, não pode ser confundida como uma transgressão ou conduta atentatória aos bons costumes. Não há qualquer ligação objetiva e direta entre o fato de um cidadão possuir tatuagens em seu corpo e uma suposta conduta atentatória à moral, aos bons costumes ou ao ordenamento jurídico.
A decisão do indivíduo fazer uma tatuagem está diretamente relacionada com a sua liberdade de pensamento e de expressão (art. 5º, IV e IX, da CF/88).
Não é razoável restringir o acesso do candidato a uma função pública pelo simples fato de possuir tatuagem. Esta restrição é flagrantemente discriminatória e carente de qualquer justificativa racional que a ampare.
O fato de uma pessoa possuir tatuagens, visíveis ou não, não pode ser tratado pelo Estado como parâmetro discriminatório quando do deferimento de participação em concursos de provas e títulos para ingresso em carreira pública. Isso porque o fato de o candidato possuir tatuagem não macula, por si, sua honra pessoal, o profissionalismo, o respeito às Instituições e, muito menos, lhe diminui a competência.
Vale ressaltar, entretanto, que é possível que a Administração Pública impeça o acesso do candidato se a tatuagem que ele possui tiver um conteúdo que viole os valores previstos na Constituição Federal. É o caso, por exemplo, de tatuagens que contenham obscenidades, ideologias terroristas, que sejam discriminatórias, que preguem a violência e a criminalidade, a discriminação de raça, credo, sexo ou origem. Isso porque tais temas são inegavelmente contrários às instituições democráticas. Se a Administração proibir tatuagens como essa, não seria uma prática desarrazoada ou desproporcional.
Portanto, desde que respeitadas as limitações constitucionais, é perfeitamente possível que candidatos que disputam cargos públicos possuam tatuagens, pois é tranquilamente permitido aos cidadãos manifestarem da forma que quiserem, logicamente dentro dos preceitos éticos e morais.
* Advogado militante, especialista em Ciências Criminais, Especializando em Direito Processual Civil e Direito de Família.