Aprovada por ampla maioria dos senadores, na semana passada, a Proposta de Emenda à Constituição 18/2020, que adia o primeiro turno das eleições do dia 4 de outubro para o dia 15 de novembro por conta da pandemia do coronavírus (Covid-19) ainda não tem sua situação definida na Câmara dos Deputados. O relator da PEC no Senado, Weverton Rocha(PDT-MA), frisou que as datas do calendário eleitoral que definem, entre outras coisas, os prazos para a realização de convenções e início da propaganda eleitoral na internet, rádio e televisão “mudaram na mesma proporção da mudança da eleição, para manter a harmonia” do calendário. Ele ainda destacou que a PEC objetiva o adiamento “por demanda do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e da comunidade médica”. O TSE, inclusive, já vinha atuando na flexibilização das regras eleitorais por conta da pandemia – no último dia 4 de junho, o tribunal permitiu a realização de convenções partidárias virtuais para a escolha dos candidatos que disputarão as eleições municipais.
Para sair do papel, porém, o adiamento das eleições municipais precisa ser aprovado por, ao menos, 308 deputados em dois turnos. E, apesar de contar com o empenho do presidente da Casa, deputado Rodrigo Maia (DEM-RJ), a proposta ainda deixa os parlamentares divididos. Na última quinta-feira, Maia expôs sua opinião pessoal em defesa do adiamento e foi enfático ao apontar o que, na sua opinião, é uma “incoerência” dos prefeitos que trabalham pela manutenção do dia 4 de outubro como a data de realização das eleições. “Eu só acho que é incoerente o prefeito estar dizendo que ainda tem crise, que precisa de mais recursos para a saúde, para manter a prefeitura funcionando, e ao mesmo tempo uma boa parte desses prefeitos defendendo a manutenção da data de outubro”, afirmou Maia, enfatizando que “a eleição não pode estar à frente de salvar vidas e de proteger as famílias brasileiras”.
A fala do presidente da Câmara ocorre por conta da insatisfação de parte dos prefeitos e vereadores que disputarão a reeleição e que, por sua vez, pressionam os parlamentares em suas bases eleitorais para que o pleito não seja transferido para novembro. O motivo é que, apesar de ser discutido por conta de uma crise sanitária, o adiamento das eleições pode trazer consequências políticas. Em um cenário atípico, no qual comícios e encontros pessoais com eleitores estão praticamente descartados por conta da necessidade de isolamento social, a campanha, sobretudo dos candidatos de oposição, é seriamente afetada. O texto aprovado no Senado, entretanto, trabalha com o adiamento da data da disputa eleitoral em 42 dias, algo que é visto como um mecanismo que favorece os candidatos de oposição, já que eles ganham mais tempo para tornarem-se conhecidos do eleitorado, potencializando suas chances nas urnas. Essa questão, inclusive, foi um dos motivos apresentados por Maia para justificar o adiamento. Para ele, a postergação da data do pleito ajuda o eleitor a tomar conhecimento “de forma democrática e transparente” dos candidatos.
Divisão
Contrário ao adiamento, o deputado federal Silvio Costa Filho (Republicanos) justifica a manutenção da data como forma de viabilizar o andamento de outros projetos no Congresso Nacional. “Eu defendo que a eleição seja no dia 4 de outubro para que a gente possa avançar na agenda das reformas que o Brasil precisa, como as reformas tributária e administrativa, e o novo pacto federativo. Quando passar a eleição, a energia do Congresso se volta à essa agenda”, afirma. Silvio diz que, hoje, “os principais partidos trabalham com o cenário da manutenção do calendário eleitoral”. “Trabalhamos nessa direção. Até então, o TSE não apresentou nenhum critério técnico baseado em estudo sanitário que aponte que 40 dias a mais ou a menos para a realização da eleição mudam algo em relação à saúde pública. Por isso, eu defendo que as eleições sejam em outubro. Estamos vendo a volta do comércio, a volta dos ônibus lotados, metrôs lotados, filas grandes para conseguir o auxílio emergencial. Essa é a realidade do Brasil e das cidades, não se tem nenhum argumento técnico que de fato justifique o adiamento”, sublinha Silvio.
O deputado federal Augusto Coutinho (SD), um dos coordenadores da bancada de Pernambuco na Câmara Federal, diverge de Silvio. Ele diz que algumas legendas que haviam reagido de forma contrária ao adiamento das eleições estão reconsiderando suas posições, o que torna a aprovação do novo calendário eleitoral de 2020 mais provável. “Eu já comecei a achar que o projeto será aprovado, sim. Estava havendo reação grande de alguns partidos, mas soube que esses partidos estão reavaliando isso”, destaca. O parlamentar frisa que é preciso haver prudência por parte dos deputados e enfatiza que, neste momento, o impacto eleitoral do possível adiamento não deve ser o aspecto principal a ser levado em conta no momento da votação do projeto. “Eu, pessoalmente, acho que na discussão desse novo prazo temos que nos guiar pelo ponto de vista da ciência. Não é o fato de você querer ou não, de achar que é bom eleitoralmente ou não, a questão que precisa prevalecer, na minha opinião, é a segurança da população. No meu entender, se temos um prazo de pouco mais de um mês para o adiamento, eu acredito que seria mais prudente adiarmos as eleições”, avalia Augusto Coutinho.
O deputado André de Paula (PSD) segue entendimento similar ao de Coutinho. Ele pondera que o clima da semana passada não era muito propício para que o projeto avançasse na Câmara – fato que, inclusive, fez o presidente Rodrigo Maia segurar a votação – mas acredita que a percepção dos parlamentares mudará nesta semana. “Eu creio que o projeto será aprovado. Na semana passada, dificilmente seria, pois havia ainda muita reação e discussões de forma passional. Eu considero que é legítimo também levar em conta os interesses pessoais, políticos e partidários, mas acho que daqui até a terça-feira a percepção geral da Casa será pelo adiamento”, ressalta André. Para ele, a manutenção do calendário, apesar de todo o cenário ocasionado pela pandemia do coronavírus e seus desdobramentos, seria um fato muito negativo para os deputados. “Diante da gravidade de uma pandemia que já ceifou mais de 50 mil vidas, se a Câmara Federal decidir não alterar seria, no meu ponto de vista, algo injustificável. Todos os parlamentares ficariam muito expostos. Eu defendo o adiamento para o dia 15 de novembro não como a melhor solução, mas como a solução possível”, justifica.
Folha de Pernambuco