O Ministério da Ciência e Tecnologia fechou acordo com cinco grandes operadoras de telecomunicações para obter informações a partir de dados anonimizados de celulares e monitorar deslocamentos durante a pandemia do novo coronavírus. A cooperação foi firmada na semana passada com o ministro Marcos Pontes e anunciada por Oi, Claro, Algar, Vivo e Tim nesta quinta-feira (2).
Segundo as operadoras, os dados fornecidos visam exclusivamente o combate à Covid-19 e estarão em uma nuvem pública, chamada de data lake, sendo “organizados de forma agregada, estatísticos e anônima”, seguindo normas da LGPD (Lei Geral de Proteção de Dados) e do Marco Civil da Internet. A LGPD, que estava prevista para entrar em vigor em agosto, corre o risco de ser adiada.
As empresas de telecomunicações dizem que vão oferecer uma solução a partir do uso de dados das redes móveis. “O MCTIC [Ministério da Ciência e Tecnologia] possui uma sala de acompanhamento do tema e poderá disponibilizar as informações a todas as esferas do poder público”, afirmam por meio de nota Na sexta-feira (27), Pontes falou em sua conta no Twitter que o Ministério da Saúde terá uma “ferramenta” para acompanhar aglomeração de pessoas. “Isso vai servir ao ministério para dizer para onde pode haver migração do vírus ou setores de hospitais que estarão mais carregados”, disse, ressaltando que “não existe nenhum problema com privacidade”.
A Telefônica, que opera sob a marca Vivo e tem 74,6 milhões de clientes em telefonia móvel, também firmou acordo de cooperação semelhante com o governo de São Paulo para análise de dados sobre deslocamento populacional, de acordo com a Reuters. Nesse caso, a parceria pode durar entre seis meses a um ano e a análise dos dados poderá ser administrada pelo IPT (Instituto de Pesquisas Tecnológicas), gerido pelo governo estadual.
A TIM também anunciou parceria similar com a Prefeitura do Rio de Janeiro para monitoramento de dados de geolocalização de seus clientes. Especialistas em direito digital afirmam que esse tipo de prática, adotada também em outros países, pode ser positiva para a formação de políticas públicas no combate à pandemia, embora seja necessário publicizar aspectos técnicos da operação.
“Passou o debate [sobre] se deve ou não haver tratamento de dados à Covid-19. É consenso nas autoridades de proteção de dados ao redor do mundo que deve ser feito esse tratamento”, diz Bruno Bioni, fundador e professor do Data Privacy Brasil.
Uma boa prática, segundo ele, seria o repasse de uma solução de inteligência das operadoras baseada nos dados agregados e anônimos, e não o compartilhamento direto desses dados. Nesse caso, os dados seriam tratados internamente e disponibilizados por meio de uma ferramenta, como um mapa de calor, por exemplo.
“Essas medidas têm que ser divulgadas para que o cidadão e outros agentes possam fazer escrutínio público. A proteção de dados não é um obstáculo, mas um ativo para que seja gerada uma inteligência e que não cause ainda mais danos do que aqueles experimentados com a pandemia”, diz.
A reportagem questionou o MCTIC sobre as práticas que serão adotadas para preservar a privacidade dos usuários, mas ainda não obteve posicionamento.
O ministro, entretanto, não citou compartilhamento de dados em seu pronunciamento, mas uma “ferramenta”; as operadoras falam em “solução”.
FolhaPress