Casos de mielites e encefalites têm chegado ao HR e surpreendido pela rapidez com que avançam
No ano passado, o setor de Neurologia do Hospital da Restauração (HR) foi surpreendido com casos da Síndrome de Guillain-Barré (SGB) relacionados ao zika vírus. Foram 150 pacientes com complicações neurológicas, sendo 57 com diagnosticados com a síndrome. Mas de janeiro a março deste ano o cenário mudou. Há mais pessoas com quadros neurológicos de mielites e encefalites, doenças que afetam a medula espinhal e o cérebro, respectivamente. E relacionados à febre chikungunya.
Assim como as complicações do zika pegou os pesquisadores de surpresa, esses também. “Temos visto mais casos. E temos verificado uma modificação na apresentação clínica neurológica dos pacientes de agora. São pessoas com muito mais acometimentos centrais do que periféricos. Isso significa mais casos de mielite e encefalite do que de Guillain-Barré”, adiantou a chefe da Neurologia do HR, Lúcia Brito.
A literatura médica, ressaltou a especialista, fala de possíveis relações da chikungunya com alterações do sistema nervoso. Mas de forma genérica e não na proporção vista agora. Ambas as inflamações (mielite e encefalite) têm uma instalação mais rápida do que SGB. “A Guillain-Barré é mais lenta. O quadro completo pode levar até uma semana para se instalar. Enquanto que na mielite isso pode acontecer em 48 horas”, exemplificou a médica. As duas doenças também tendem a deixar mais sequelas.
PESQUISA – Essa diversidade de alterações do sistema nervoso no momento da epidemia atual será o ponto de partida para uma pesquisa em Pernambuco em até dois meses. O levantamento buscará explicar a ocorrência dessas doenças neurológicas e o agente viral que as provoca. “Serão avaliados 100 casos de quadros neurológicos relacionados ao zika e 100 casos de outros quadros neurológicos relacionados a outras infecções já conhecidas. Precisamos saber se o zika é uma marca de gravidade, se a mortalidade é maior. Se há mais sequelas, obviamente, observar a frequência de adoecimento”, esclareceu o médico e consultor do Ministério da Saúde, Carlos Brito, que junto com Lúcia Brito encabeçara o levantamento.
FIOCRUZ – A formação internacional de conhecimento sobre o ataque do zika ao sistema nervoso de adultos foi uma dos temas de encontro na Fiocruz Pernambuco ontem. Representantes da OPAS e da OMS e pesquisadores latinoamericanos, do México, Colômbia, Equador e El Salvador, mas também dos Estados Unidos e da Suíça, estão reunidos até hoje para traçar estratégias conjuntas de vigilância, diagnóstico e pesquisa para o vírus zika.
USP desenvolve teste para zika
Um teste que pode diagnosticar infecções por zika vírus a partir da identificação de anticorpos específicos no sangue do paciente. A descoberta é de pesquisadores do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da Universidade de São Paulo (USP). O método permite diagnosticar com mais eficácia as pessoas infectadas pelo vírus. Após a validação laboratorial, o teste foi utilizado em amostras de sangue de mulheres do município de Itabaiana, em Sergipe. Segundo o ICP, o desenvolvimento da metodologia envolveu o uso de técnicas de biologia molecular.
A procedimento desenvolvido pelo grupo permitiu confirmar que a maioria das oito mães de bebês com microcefalia, analisadas no município sergipano, é soropositiva para a infecção pelo zika vírus, assim como seus filhos.
“Com esse método podemos demonstrar a especificidade da detecção do zika, superando uma deficiência séria dos sistemas sorológicos até agora disponíveis”, explica o vice-diretor e coordenador do Laboratório de Desenvolvimento de Vacinas do ICB-USP, Luís Carlos de Souza Ferreira.
Segundo os pesquisadores, a partir desta plataforma diagnóstica será possível obter dados mais precisos sobre o número de infecções por zika no País e, especialmente, obter confirmação de infecção do vírus em gestantes, para que elas tenham o atendimento adequado. Os reagentes necessários para a realização do teste estão em produção emergencial e serão distribuídos gratuitamente para centros de pesquisa da Rede Zika e para demais laboratórios científicos do País.
Folha de Pernambuco