O projeto de lei aprovado ontem no Senado, que prevê metade das vagas de universidades federais para alunos oriundos da rede pública, é visto com reservas por educadores. Para o diretor da Fapesp e ex-reitor da Unicamp Carlos Henrique de Brito Cruz, o projeto de lei é ruim porque fere a autonomia. “É uma usurpação da autonomia universitária, porque viola o direito de que cada instituição decida o modelo mais adequado, que tenha mais relação com a sua tradição de avaliar o mérito acadêmico”, argumenta.
Para o professor Ocimar Alavarse, da Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo (USP), o estabelecimento de cotas sociais é importante à medida em que pode facilitar o acesso de estudantes de escolas públicas a cursos mais concorridos. “Basta ver os cursos mais disputados de qualquer universidade pública, para ver como é raríssimo encontrar algum estudante oriundo do sistema público”, diz – o que, segundo ele, perpetua a disparidade social, já que os estudantes do sistema público tendem a ter um nível socioeconômico mais baixo.
Uma boa implementação da política, no entanto, depende de estudos prévios. “É preciso pegar os dados do Sistema de Avaliação Básica (Saeb), para entender as particularidades desses estudantes de escolas públicas. Eles não são todos iguais”, avalia. “Não dá para fazer políticas genéricas.” Quanto às cotas raciais, ele é contrário. “Acho que isso não funciona, porque vai muito da autodefinição e os detalhes e diferenças são todos muito sutis”, explica Alavarse.
Segundo o projeto de lei, nas vagas reservadas a cotas sociais ocorrerá um ajuste racial, feito com base nos porcentuais dos perfis étnicos em cada Estado. Por exemplo, a reserva de vagas para negros em Santa Catarina será menor que na Bahia.
Nas universidades estaduais paulistas, a discussão sobre cotas raciais está fora da pauta. Assim que o Supremo Tribunal Federal (STF) votou pela constitucionalidade das cotas raciais, em abril deste ano, USP, Unesp e Unicamp se disseram contrárias à medida. Elas defendem a prevalência do mérito na seleção, embora tenham ações de inclusão – sem, no entanto, reservar vagas.
Atualmente, a USP mantém o Programa de Inclusão Social (Inclusp) que dá bônus no vestibular a estudantes da rede pública. Neste ano, 28% dos novos alunos vieram de escolas públicas. Mesmo sem reservar vagas, a Unicamp é a única que tem benefício específico para pretos, pardos e indígenas. Eles chegam a receber 7% de bônus na nota, cerca de 2 pontos porcentuais a mais que alunos de escola pública – também beneficiados. No último vestibular, 8 9% dos matriculados na Unicamp vieram do grupo de pretos, pardos e indígenas. Das três, a Unesp foi a que mais incluiu alunos vindos de escolas públicas: 41%.
Fonte: Agência Estado