Pernambuco entrou no rol de estados em situação de equilíbrio entre o número de vagas e a população do sistema socioeducativo. A taxa de ocupação das unidades da Fundação de Atendimento Socioeducativo (Funase) chegou, na terça-feira (30), a 99%, com 817 vagas de internação para 809 socioeducandos. Esse resultado foi possível graças ao esforço conjunto do Poder Executivo, do Judiciário, do Ministério Público (MPPE) e da Defensoria Pública (DPPE) estaduais, que formaram um grupo de trabalho e, desde junho, estão envolvidos em mutirões para a análise dos processos de adolescentes e jovens em conflito com a lei. As sessões, chamadas de audiências concentradas, deram celeridade à reavaliação de casos, viabilizando substituições, suspensões e extinções de medidas de internação. Outra parcela de socioeducandos permaneceu na Funase mesmo após as avaliações de relatórios.
Os dados foram apresentados, nesta quarta-feira (31), em entrevista coletiva promovida pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE). Na ocasião, foi explicado que os juízes devem reavaliar a situação de um socioeducando em períodos de até seis meses, com apoio de promotores de Justiça e de defensores públicos, independentemente da realização de mutirões. Desde 2016, contudo, o Judiciário pernambucano já promove audiências concentradas para garantir maior rapidez na análise dos processos. Em 7 de junho de 2019, mais um avanço: esses mutirões deixaram de ser uma recomendação e passaram a ser obrigatórios a todas as Varas Regionais da Infância e Juventude do Estado, a partir de um provimento do Conselho da Magistratura do TJPE.
Para substituições, suspensões ou extinções de medidas socioeducativas, são considerados critérios como a natureza do ato infracional cometido, se houve reincidência, o bom comportamento do adolescente, a participação dele em atividades pedagógicas, entre outros itens. Um socioeducando internado, por exemplo, pode ter a medida mantida ou convertida em semiliberdade, o que ainda o deixa sob responsabilidade da Funase. Outra decisão possível pode ser seu encaminhamento para os regimes de liberdade assistida e/ou de prestação de serviços à comunidade, que são medidas em meio aberto e executadas pelos municípios, sem ingerência da Funase. Por fim, também pode ocorrer a extinção da medida socioeducativa cumprida pelo jovem.
Mesmo quando não ocorre em regime de mutirão, a análise de processos de socioeducandos leva em conta relatórios produzidos por psicológicos, pedagogos, assistentes sociais e advogados. Esses servidores, em sua maior parte, concursados da Funase, têm sua atividade regida pelos preceitos éticos de seus conselhos profissionais, assegurando a emissão de pareceres com rigor técnico e de forma independente. A decisão final é dos juízes, após manifestações de promotores de Justiça e defensores públicos, o que garante várias instâncias de avaliação e, inclusive, a possibilidade de entendimentos diferentes dos indicados nos relatórios.
PRÓXIMAS AÇÕES – A Funase está se articulando para possibilitar que os socioeducandos que saíram da instituição nas audiências recentes tenham condições de seguir projetos de vida longe da criminalidade. A instituição está em tratativas com a Secretaria de Desenvolvimento Social, Criança e Juventude (SDSCJ), à qual é vinculada, para agilizar a busca ativa dos egressos para inclusão em programas como Vida Aprendiz e Novas Oportunidades, que ofertam, entre outras ações, cursos profissionalizantes e a inserção em vagas do Jovem Aprendiz. A adesão deles é voluntária. Também há articulações com a Secretaria de Políticas de Prevenção à Violência e às Drogas e a Secretaria de Educação e Esportes de Pernambuco.
“Já adotamos, normalmente, ações como essas para outros egressos, mas estamos intensificando as articulações com foco nos jovens liberados recentemente. O objetivo é evitar que esses socioeducandos e socioeducandas reincidam em atos infracionais”, explicou a presidente da Funase, Nadja Alencar, que esteve presente à entrevista coletiva. “O que foi feito em Pernambuco teve muita seriedade e competência. Mostra a importância de um trabalho em rede”, completou o coordenador da Infância e Juventude do TJPE, desembargador Luiz Carlos Figueiredo, destacando ações futuras para a manutenção do equilíbrio.
Outra frente de ação será o monitoramento de informações. A Funase já contabiliza, anualmente, os índices de reincidência a partir de números de adolescentes que regressam ao sistema socioeducativo. Agora, esse acompanhamento será feito especificamente com os jovens beneficiados pelas audiências concentradas promovidas pelo Judiciário desde junho deste ano. A Funase também já elaborou, de forma conjunta com o Judiciário, o MPPE, a DPPE e entidades da sociedade civil organizada, uma proposta de Gestão de Vagas do Sistema Socioeducativo, que permitirá o encaminhamento eficiente e equilibrado de adolescentes em conflito com a lei para as unidades socioeducativas do Estado. O documento está em fase de avaliação por técnicos da Secretaria da Casa Civil.
NOVAS UNIDADES – O Governo de Pernambuco pretende entregar, até dezembro, os Centros de Atendimento Socioeducativo (Case) Recife, com 90 vagas, e Guararapes, em Jaboatão, também com 90 vagas. O primeiro já está pronto e em fase de licitação de equipamentos para seu funcionamento, e o segundo tem mais de 90% da construção concluída. Ambos serão voltados à internação de adolescentes do sexo masculino. Com isso, até o fim de 2019, Pernambuco terá 997 vagas de internação. Em janeiro deste ano, uma terceira unidade – o Case Pirapama, no Cabo de Santo Agostinho, com 72 vagas –, já havia começado a funcionar.
STF – A criação do grupo de trabalho e a intensificação da revisão de processos de socioeducandos ocorreram em cumprimento a uma liminar do ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), que, em 23 de maio deste ano, determinou ao Rio de Janeiro, à Bahia, ao Ceará e a Pernambuco a adoção de medidas para o equilíbrio entre o número de vagas do sistema socioeducativo e o quantitativo de adolescentes atendidos. Segundo a decisão, as unidades de internação não poderiam ter ocupação maior que 119% de sua capacidade. Com a taxa atual de 99%, portanto, Pernambuco já está bem abaixo do limite estipulado e cumprindo a determinação.