Relacionado aos casos de microcefalia em recém-nascidos, mas ainda com extensão da gravidade desconhecida pelos pesquisadores, o zika vírus avança no País e no Mundo e pode trazer um novo complicador: além do Aedes aegypti, ser transmitido também pelo Culex, nome científico da muriçoca. A celeridade da doença, que começou com um caso na Bahia em maio do ano passado e já está presente em 20 estados, levou a Fiocruz Recife a pesquisar se essa transmissão é possível. A Fundação também conduz estudo sobre a coinfecção – quando em uma mesma picada o mosquito passa mais de uma virose, como dengue e chikungunya, por exemplo.
Nesta segunda-feira (25), o ministro da Saúde, Marcelo Castro, reconheceu, mais uma vez, a gravidade da situação em público, o que levou a presidente Dilma Rousseff a repassar para o ministro da casa Civil, Jaques Wagner, a coordenação das ações do governo para a dengue e zika. O avanço da doença também preocupa a Organização Mundial de Saúde, que lançou alerta ontem sobre a proliferação do vírus no continente americano.
Explicar a velocidade da epidemia de zika no Brasil está no cerne de uma pesquisa da Fiocruz Recife. O estudo está analisando a possibilidade de transmissão também pela muriçoca (Culex), além do Aedes. O levantamento verifica ainda se o zika tem um menor tempo para a replicação viral no vetor. No caso da dengue o período de incubação no inseto dura em média de 7 a 15 dias, quando só então ele passa a contaminar os humanos com a picada. No zika, isso pode ocorrer em três dias. O vírus já teve a circulação confirmada em 20 unidades da federação em menos de um ano, o que espantou as autoridades de saúde do País.
“O mosquito principal, que é considerado vetor, é o Aedes. O Culex a gente está testando pela primeira vez, ninguém nunca testou”, destacou a pesquisadora e vice-diretora de ensino da Fiocruz Pernambuco, Constância Ayres, que iniciou a pesquisa em outubro de 2015. O resultado que comprovará ou descartará a transmissão pela muriçoca será divulgado em três semanas. No mesmo prazo será apresentado se o vírus se replica mais rapidamente ou não no vetor.
A equipe do departamento de Entomologia da Fiocruz trabalha com uma amostra de 200 mosquitos de cada uma dessas duas espécies que foram gerados em laboratório, livres de qualquer infecção. Os insetos foram alimentados com sangue infectado por zika. Em seguida, foi iniciada uma perícia minuciosa, como a análise no intestino e na glândula salivar do inseto para verificar a presença do material genético do vírus. “Se a gente detectar zika na glândula salivar significa que o mosquito pode transmitir o vírus”, disse.
Outro objeto de investigação é o tempo que o zika leva entre a incubação do mosquito “virgem” até tornar-se transmissor da doença. “O que se acredita é que o tempo de replicação do vírus no mosquito para a zika é menor. A dengue é de 7 a 15 dias. O zika deve ser três dias”. De acordo com ela, o fator climático pode interferir na velocidade de replicação. Quanto mais alta a temperatura, mais rápido o zika pode se replicar no vetor e mais rápido transmitir a doença.
Mudanças
Se for confirmada a capacidade da muriçoca também transmitir o zika muito pode mudar no planejamento de prevenção e contenção da epidemia. “Se houver essa confirmação teremos que fazer certas adaptações e junções de atividades. Mas não temos nenhuma evidência científica falando sobre outros mosquitos que não seja o Aedes”, comentou a gerente de Vigilância de Riscos Ambientais da Secretaria Estadual de Saúde (SES), Rosilene Hans.
Casos de infecção
Outro estudo conduzido pela Fiocruz Pernambuco é o estudo de campo com mosquitos capturados nas ruas do Recife e Arcoverde, no Sertão. Nesse caso, agentes de endemias que já foram treinados pelos pesquisadores coletam os insetos para serem avaliados em laboratório. O objetivo é verificar que vírus podem ser encontrados no vetor.
Constância Ayres informou que será possível saber, por exemplo, se é possível que um mosquito consiga transportar os quatro tipos de dengue, além de zika e chikungunya. Já há relatos da coinfecção de dengue e chikungunya no México e Venezuela. “Vamos poder saber qual a frequência de vírus que esses mosquitos estão infectados. A epidemia é um reflexo do que acontece com a circulação dessas linhagens de vírus no mosquito. A circulação das linhagens virais na população do mosquito é o que estamos investigando”, detalhou.
Cepas
Um fato que pode ser esclarecido é inclusive se há apenas uma cepa do zika circulando no Estado. Há a indicação que o zika que esteja por aqui seja o tipo asiático. Mas há, ainda, uma cepa africana descrita na literatura científica mundial. Algumas amostras de mosquitos Aedes pegos no Recife já estão na Fiocruz. No entanto, o laboratório ainda aguarda o material de Arcoverde. Ainda não há previsão para os resultados dessa investigação de campo.
Folha de Pernambuco