Alegoria Vitoriense: O CISNE

Na antiguidade, em época de boas colheitas, para agradecer aos deuses, os camponeses realizavam festas nas quais enfeitavam seus corpos e, envolvidos pela música, demonstravam a alegria que sentiam em seus corações.

Poderíamos até afirmar que estas seriam as origens remotas do carnaval, mas uns alegam que as manifestações carnavalescas remontam às comemorações a Ísis e ao boi Ápis no antigo Egito; outros, às celebres bacanais, dos gregos, ou às saturnais, festas pagãs dos romanos.

Na Idade Média, com a repressão da Igreja, destas celebrações pagãs, sobrevivem apenas as máscaras que, mais tarde, no século XVI, evoluíram para as fantasias, permanecendo até os dias atuais. Nessa época, a festa pagã chega ao Brasil com o nome de entrudo, também denominado brinquedo selvagem, mela-mela como vemos ainda hoje, em algumas cidades do interior, sendo festejada tradicionalmente no sábado, domingo, segunda e terça-feira que antecedem o período da quaresma.

Entrudo, retratado no século XIX pelo pintor francês Debret.

Atualmente, em nosso país, existem três pólos monopolizadores do carnaval: o Rio de Janeiro, onde predomina o samba; a Bahia, cujo forte é o carnaval estilizado, comandado pelos trios elétricos; e, por fim, o mais fiel à tradição, que é o de Pernambuco, com uma infinidade de manifestações folclóricas, em que há o predomínio da criatividade e da popularidade, como: maracatus, caboclinhos, ursos, bois, blocos, etc…

Para cada expressão de folclore, existe uma particularidade especial, o maracatu de baque virado e o maracatu de baque solto ou rural. O maracatu de baque solto tem como sede a cidade de Aliança, interior de Pernambuco, denominada Associação dos Maracatus de Baque Solto. Os clubes de frevo são originários do Bairro de Santo Antônio, São José e da Boa Vista, tendo como primórdios antigas corporações ou profissões, tais como: carvoeiros, ferreiros, varredores. Já os blocos, são originários da poesia e do saudosismo. Eles surgiram das grandes reuniões familiares, como extensão dos pastoris e dos ranchos. Além das troças de caboclinhos, ursos e dos bois, ainda dispomos dos Papangus, de Bezerros; dos Bonecos Gigantes, de Olinda; do Clube de Máscaras Galo da Madrugada, e do carnaval de alegoria de Vitória de Santo Antão.

A cidade de Vitória de Santo Antão está aproximadamente a 48 km da cidade do Recife, sendo considerada, a grande defensora do carnaval de alegoria do estado de Pernambuco, com um grande número de agremiações do gênero. Trata-se de clubes que tiveram suas origens na segunda metade do século XIX, mesma reverência ao carnaval europeu.

O carnaval vitoriense caracteriza-se por sua grande diversidade. São troças, clubes de fados, de manobras, alegorias, os belíssimos maracatus, caboclinhos, escolas de samba e por fim os gigantescos blocos de trio, que contribuíram para os 127 anos de folia vitoriense, tornando-se por diversas vezes um dos melhores – ou senão o melhor – dos carnavais do interior de Pernambuco.

É certo que houve uma grande desfiguração carnavalesca após a chegada, no início da década de 90, dos trios baianos e seu Axé ensurdecedor, causando um grande choque de ritmos e estilos, que de uma forma estranha fez com que a própria população deixasse suas origens e culturas de lado. Mas, acreditava-se em uma inovação, modernização e diversificação, que, infelizmente, tornou-se uma escancarada descaracterização.

O carnaval em Vitória chegou ao seu apogeu na primeira parte do século XX, onde foram criados diversos tipos de agremiações que faziam a população festejar com muita alegria. Dentre elas, os Clubes de Fados e os Clubes de Manobras. Estes últimos, com inúmeros fãs, realizando grandes desfiles e bailes, principalmente o “Abanadores”, posteriormente batizado como “O Leão” pelo poeta Teopompo Moreira (JOSÉ ARAGÃO, 1983, p. 300), e o “Vassouras”, conhecido como “O Camelo”.

Segundo o professor José Aragão, no seu livro História da Vitória de Santo Antão, volume III, foi em uma dessas grandiosas apresentações que tudo começou. O “Vassouras’’ vinha do bairro do Livramento e da Matriz vinha o “Abanadores”, fazendo os rivais se chocarem durante o percurso, levando as a autoridades ordenarem o recolhimento às suas sedes, prevendo piores conseqüências. Posteriormente, pensando em evitar tais interrupções, vários foliões reuniram-se para fundar uma nova agremiação, formada em sua maioria por motoristas como afirmou o célebre jornalista João Álvares:

O Clube dos Motoristas da Vitória de Santo Antão foi fundado no mês
de março do ano de 1949, idealizado por um grupo de motoristas e pessoas ligadas
ao ramo automobilístico que desejavam construir um clube para proporcionar lazer
para os profissionais do volante, bem como cultivar solidariedade e o espírito
de disciplina e cooperação nas relações humanas.
Foi assim que surgiu o “Clube dos Motoristas”, em reunião realizada em 04 de março de 1949, pelos seus fundadores: “Valdemar Lino Chaves (1º presidente), Alfredo Francisco de Oliveira, João Vicente de Freitas, Sebastião Ferreira do Nascimento, Joaquim Francisco Damásio, Pedro Ferreira Guimarães, Abiatar Ferreira Chaves, Manoel José de Souza e Sebastião Pinheiro de Souza” (HISTÓRICO: CLUBE DOS MOTORISTAS, 2004, p. 09) Com a presença de mais de 80 pessoas, naquele mesmo dia, a primeira diretoria ficou assim formada: presidente – Valdemar Lino Chaves, vice-presidente – Jefre Coelho de Albuquerque, 1º secretário – Tertuliano de Albuquerque Barros, 2º Secretário – Valdemiro Lino Chaves, orador – José Hermínio da Silva, diretor – José Vicente de Freitas, fiscal – José Hipólito dos Santos, tesoureiro – Sebastião Barbosa de Araújo (JOSÉ ARAGÃO, 1983, p. 302) empossados dois dias depois.

No ano seguinte, em 1950, estreava-se pelas ruas da cidade, já com muita alegria, que ao longo dos anos foi atraindo muito mais foliões.

A primeira sede, era localizada na Rua Prefeito João Cleofas, sendo vendida, posteriormente, em 1965, pelo então presidente João Álvares, com a idéia de construir uma nova sede, vindo a ser inaugurada no dia 20 de julho do ano de 1971, no bairro do Cajá.

Entre os anos de 1965 e 1971, as reuniões eram realizadas na sede da Associação Comercial, na Avenida Mariana Amália, sendo o ponto de concentração nos dias de desfile, onde, por horas, se reuniam dezenas de foliões, aguardando, ao som da orquestra em aquecimento, o momento da sua saída.

Alegorias

O “Motoristas” destacava-se pelos seus belíssimos carros alegóricos, baseados nos temas criado para cada carnaval. Em 1966, uma alegoria criada pelo grande artista vitoriense José Marques de Sena (fundador do Museu do Carnaval) em homenagem à Marinha do Brasil, causou muitos comentários durante o seu desfile, devido a um grande Cisne (símbolo da Marinha) no carro principal.


A figura do Cisne fez tanto sucesso, que a população não parava de comentar durante os três dias de carnaval daquele ano. Devido à grande repercussão do Cisne entre os foliões, a então diretoria decidiu adicionar “O Cisne” em seu nome, passando a se chamar “Clube dos Motoristas – O Cisne”. Mas, segundo o alegorista José Marques de Sena “Mas cisne ainda é apelido, não é nome”.


Em 1969, a chegada do homem à Lua trouxe inspiração ao artista José Marques de Sena, resultando em uma histórica alegoria que chegou a ganhar destaque nos jornais da capital após sua exibição no carnaval de 1970, merecendo além dos aplausos, um grande agradecimento do Consulado Americano.

O sucesso se repetiu por diversos carnavais, sempre com seus temas originais e carros alegóricos com muita criatividade.


Com a febre dos trios elétricos, o “Clube dos Motoristas – O Cisne” passou por diversas dificuldades, chegando a diminuir suas exibições e, durante alguns anos, chegou a não conseguir colocar-se nas ruas.


Do Blog do Arquiles Petrus